Folha de S. Paulo
Após sete anos, os Estados Unidos modificaram sua recomendação para o rastreamento do câncer de mama. Segundo as novas diretrizes, mulheres que não pertencem aos grupos de risco devem começar a fazer mamografias de rotina a partir dos 50 anos, e não mais a partir dos 40. As novas orientações mudam também a frequência: dos 50 aos 74 anos, os testes devem ser realizados a cada dois anos, e não anualmente. As novas diretrizes, elaboradas pelo US Preventive Services Task Force, um grupo influente de pesquisadores ligado ao governo americano, foram publicadas ontem no periódico "Annals of Internal Medicine".
Segundo os autores, a mudança visa evitar o excesso de exames desnecessários e diminuir o número de resultados falsos positivos. Além disso, dizem eles, as mamografias podem apontar tumores que cresceriam tão devagar que nunca seriam detectados. Nesses casos, a paciente passaria por um tratamento sem necessidade.
Para Ricardo Chagas, presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia, há muitas divergências sobre o assunto.
"Por agora, isso não deve mudar condutas no Brasil", diz. "Mas há uma tendência de mudança a longo prazo." Segundo ele, hoje se recomenda o rastreamento acima dos 40 anos para os grupos de risco.
Os especialistas americanos defendem ainda que não há comprovação dos benefícios do autoexame ou dos exames de toque feitos por médicos.
A maioria dos países segue um plano de mamografias regulares após os 40 ou 50 anos, para detectar tumores no início. O câncer de mama é o que mais mata mulheres no mundo -500 mil por ano.
Controvérsia
A Sociedade Americana de Câncer disse que pretende ignorar as novas diretrizes. Em outubro, a entidade reconheceu que os exames haviam sido superestimados, mas não mudou suas recomendações.
Para José Roberto Filassi, chefe do setor de mastologia do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias de Oliveira, entre os 40 e 50 anos a falha nos diagnósticos por mamografia é muito grande. "O exame está passando por uma reavaliação. Uma meta-análise da Cochrane concluiu que não há certeza de que os benefícios sejam maiores do que o risco."
O trabalho da Cochrane, baseado em sete estudos com 600 mil mulheres, concluiu que o rastreamento precoce do câncer de mama leva à redução de 15% na mortalidade e a 30% de exagero no diagnóstico e no tratamento. Segundo o estudo, o rastreamento aumenta a sobrevida de uma em cada 2.000 mulheres e faz com que dez sejam tratadas sem necessidade.
Segundo a mastologista Maira Caleffi, presidente da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama, "não existe nada melhor, por enquanto, do que fazer o diagnóstico precoce. Há problemas com exames em larga escala? Há. Mas nem por isso tem que deixar de fazer ou adiar a mamografia".
Para Sergio Simon, professor de oncologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a diretriz proposta nos EUA faz pouca diferença para o Brasil. "Aqui, a lei diz para fazer aos 40, o Inca diz que é a partir dos 50 e, mesmo assim, não conseguem fazer direito nem para essa população. Quando estiverem fazendo tudo direitinho, aí podemos conversar sobre a idade e o intervalo ideais."
O Ministério da Saúde disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não comentaria. <br /