Segundo um estudo publicado, em 2019, no Journal of Management & Primary Health Care, no Brasil, em 516 dos 5.570 municípios brasileiros, o câncer já é a principal causa de morte. “A construção de políticas públicas no Sistema Único de Saúde (SUS) são por vezes insuficientes e fazem com que a sociedade civil procure o Direito a Saúde através da judicialização”, diz o estudo de Carla Mazzuco e Samara Jamile Mendes.
Nas farmácias e drogarias, o preço de um medicamento oncológico pode variar de R$ 80 a R$ 54 mil, dificultando o acesso por milhares de brasileiros. Aqueles que não conseguem obter o medicamento pelo SUS ficam excluídos e sem possibilidades de tratar a doença.
No entanto, esse cenário poderia mudar se a carga tributária que incide sobre os medicamentos no País fosse revista. Não apenas os oncológicos, mas medicamentos em geral têm carga elevada, o que impacta diretamente no preço final e no acesso por parte da população.
Um dos impostos que mais pesam é o ICMS, que, no Estado do Rio de Janeiro, chega a 20%, já incluídos os 2% destinados ao Fundo de Promoção Social e Erradicação da Pobreza. É com o objetivo de reduzir essa alíquota que tramita, na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), o Projeto de Lei nº 2.852/2020, propondo equiparar o valor do ICMS do Estado à alíquota praticada em São Paulo: 12%. A equiparação seria válida para medicamentos genéricos e similares. Além disso, o PL também pede a isenção do imposto para medicamentos utilizados no tratamento do câncer.
Menores preços para população
Para Jiovanni Coelho, CEO da SimTax, equiparar a alíquota do Rio de Janeiro à de São Paulo traz muitos benefícios à população: “Um medicamento com Preço Máximo ao Consumidor (PMC) de R$ 100 passaria a custar R$ R$ 90,91 se a alíquota do ICMS fosse reduzida de 20% para 12%, uma diminuição efetiva de 9,09% no preço final”, explica Coelho.
O consultor jurídico da ABCFARMA, Rafael Espinhel, concorda. Segundo ele, o acesso aos medicamentos e, consequentemente, a um tratamento de qualidade acaba sendo limitado pelos altos preços impactados pela tributação, especialmente pelo ICMS.
“Sob o ponto de vista social, o PL é de extrema importância, pois assegura o direito constitucional de acesso à saúde aos cidadãos do Estado do Rio de Janeiro. Atualmente, segundo estudos, aproximadamente 50% das pessoas abandonam os tratamentos médicos depois de um período de seis meses, sendo um dos principais fatores o custo do medicamento”, pontua o advogado.
Além dos benefícios à população, a redução da alíquota de ICMS para alguns medicamentos e a isenção para os oncológicos também impactaria positivamente no faturamento das farmácias, pois mais pessoas conseguiriam comprar os produtos de que necessitam, atraindo mais investimentos também para a indústria farmacêutica.
Benefícios para o governo
Rafael Espinhel acredita que a mudança será benéfica também para o governo estadual. Ele cita como exemplo a redução de 18% para 12% no ICMS do Estado do Paraná, em 2009: “Mesmo com a mudança na alíquota, a arrecadação desse imposto com medicamentos subiu mais no Paraná do que nos oito principais estados que mantiveram as suas alíquotas, crescendo 115% em relação a 2008. Nos demais estados, a arrecadação aumentou apenas 9%, ou seja, apesar da redução na alíquota do ICMS, não houve perda arrecadatória para o Estado”, relembra o consultor jurídico.
Espinhel cita ainda os reflexos positivos no SUS: “Quando há adesão ao tratamento e uso correto dos medicamentos, o Estado economiza em despesas com saúde, em especial com internações, exames e consultas”, acrescenta ele.
Tramitação do PL
Atualmente, o PL está parado na primeira etapa de tramitação – a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) – e aguarda parecer do relator Rodrigo Bacelar para que seja votado nessa comissão. Eduardo Britto, analista político da Arko Advice, explica que, depois disso, o PL pode tramitar sozinho ou em conjunto com outros que tratem de temas parecidos.
“Independentemente de ele tramitar em conjunto ou sozinho, há um requerimento de urgência já aprovado e deferido por ter sido apresentado durante o período da pandemia. Isso significa que ele pode pular a etapa das comissões e ir diretamente ao Plenário. Contudo, o procedimento que está vigorando na casa, na maioria dos casos, é que o projeto seja primeiramente apreciado na CCJ e, somente a partir dessa votação, seguir para o Plenário”, informa Britto.
Para o analista político, a discussão do PL encontra um ambiente propício para avançar no parlamento, já que a Alerj, ao longo da pandemia, passou por um longo e extenso processo de debate sobre benefícios fiscais e questões tributárias no sentido de gerar mais competitividade ao Estado do Rio de Janeiro.
Detalhes sobre o Projeto
O PL foi protocolado em julho, na Alerj, pelo deputado Rosenverg Reis (MDB-RJ). Contudo, a redação do projeto foi iniciada em novembro de 2019, quando, por iniciativa da Ascoferj, o presidente da instituição, Luis Carlos Marins, apresentou ao deputado um documento que detalhava a necessidade de uma revisão tributária no estado.
“Atualmente, o Rio de Janeiro chega a pagar uma alíquota de ICMS sobre medicamentos em torno de 18% a 20%. A elevada carga tributária prejudica o negócio e impacta o acesso da população ao medicamento. Esse PL é importante para todo o setor farma, principalmente para consumidores”, defende Marins.
Panorama geral do RJ
Jiovanni Coelho, contudo, acredita que a situação tributária do Rio de Janeiro é bastante complicada e envolve aspectos que vão além da alta alíquota do ICMS: “O modelo de cálculo ainda é um problema para todos. Você imaginaria que uma distribuidora de medicamentos, vendendo um medicamento pelos mesmos preço e desconto, teria uma tributação igual a de outras, certo? Mas a resposta é não”, pondera o especialista.
Ele explica que o Estado, apesar de possuir uma regra geral de cálculo tributário de medicamentos, permite várias outras regras que diferenciam as empresas e tornam todo o processo mais difícil. Alguns exemplos disso são as que conseguem entrar na Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro (Codin) e, lá dentro, podem utilizar ou não a Margem de Valor Agregada (MVA). Além disso, existem empresas que fazem parte do Programa de Fomento ao Comércio Atacadista e Central de Distribuição do Estado do Rio de Janeiro (Riolog).
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Fonte: Revista da Farmácia