A dúvida é recorrente e exige cuidado, mas, afinal, é possível devolver ou trocar medicamento que não foi utilizado na farmácia ou drogaria onde foi adquirido? A resposta é: depende!
Vale ressaltar que o farmacêutico, enquanto profissional que visa contribuir para a segurança e a promoção da saúde, tem papel fundamental na garantia do uso racional de medicamentos e tem o dever de orientar o cliente quanto aos procedimentos legais cabíveis e aos riscos sanitários decorrentes da devolução de um medicamento (controlado ou não) à prateleira de vendas.
Quando é possível a devolução
O Código de Defesa do Consumidor – CDC, que estabelece normas de proteção do consumidor, descrito na Lei 8.078/90, determina em seu artigo 18 que “os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas”.
Essa determinação assegura ao consumidor que em casos de medicamentos dispensados em que o paciente verifique posteriormente um desvio de qualidade, o estabelecimento farmacêutico deverá obrigatoriamente aceitar a devolução e dar direito ao cliente de escolher entre: substituir o medicamento (por outro) da mesma espécie em perfeitas condições de uso; restituir de forma imediata a quantia paga ou realizar o abatimento proporcional do preço no momento da compra.
Alguns desvios de qualidade observados em medicamentos são: alterações de aspecto, cor, odor, sabor, número de comprimidos na embalagem, volume ou presença de corpo estranho ou validade do produto.
Quando não é possível a devolução
Caso o cliente opte em devolver o medicamento por não querer mais o produto ou por necessidade de interrupção do tratamento, a farmácia não tem a obrigação de aceitar a devolução. Para os medicamentos controlados, de acordo com duas normas sanitárias: o artigo 44 da Portaria SVS/MS 344/98 e o artigo 90 da Portaria SVS/MS 6/99 informam que, nesses casos, o consumidor deve encaminhar o medicamento controlado à Vigilância Sanitária da sua região.
Portaria SVS/MS 344/98
Art. 44. Quando, por qualquer motivo, for interrompida a administração de medicamentos à base de substâncias constantes das listas deste Regulamento Técnico e de suas atualizações, a autoridade sanitária local deverá orientar o paciente ou seu responsável sobre a destinação do medicamento remanescente.
Portaria SVS/MS 06/99
Art. 90. Quando, por qualquer motivo, for interrompida a administração de medicamentos à base de substâncias constantes das listas da Portaria SVS/MS 344/98 e de suas atualizações, o prescritor e/ou a autoridade sanitária local devem recomendar ao paciente ou a seu responsável que faça a entrega desses medicamentos no órgão competente de Vigilância Sanitária. A autoridade sanitária emitirá um documento comprobatório do recebimento e, posteriormente, dará o destino conveniente (inutilização ou doação).
Risco sanitário
O maior motivo para que medicamentos não possam ser trocados com tanta facilidade, como celulares e outros produtos, é que existe o chamado risco sanitário, que preza pela segurança da saúde do próprio consumidor.
Essa situação se torna efetiva, por exemplo, quando o consumidor do medicamento, após efetuar a compra do produto e ao sair da farmácia ou drogaria, tira do farmacêutico, que deve zelar pelo bom condicionamento do medicamento, a responsabilidade por aquele item. Dessa forma, uma vez que esse profissional não tem maneiras de validar pela qualidade do produto, essa troca não é possível, pois não há garantia de que o consumidor observou os cuidados de armazenamento para sua preservação e, portanto, que um eventual novo paciente que tomar aquele medicamento terá sua saúde preservada.
Medicamento controlado
No caso do medicamento controlado e de antibióticos, existe, também, o risco sanitário por ocasião de uma possível troca. Contudo, esse não é o único fator a ser analisado para a impossibilidade de devolução.
O medicamento controlado se sujeita a normas diferenciadas dos demais:
A Portaria 06/1999 (Artigo 93, 4º Parágrafo), que aprova o Regulamento Técnico sobre substâncias e medicamentos sujeitos ao controle especial, diz que um produto dessa categoria ao sair do estabelecimento farmacêutico deve ter sua “baixa” efetuada pelo farmacêutico no Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC) ou no Livro de Registro Específico (que é documental para efeito de controle e fiscalização), por meio da receita ou notificação de receita do paciente/comprador.
Para que um produto tenha sua “entrada” efetuada no livro citado, ela deverá ser feita por Nota Fiscal de compra (de uma distribuidora, por exemplo) e não por qualquer outro meio, como a devolução do medicamento.
De forma semelhante, as entradas e saídas dos antibióticos nas farmácias e drogarias também necessitam ser registradas no SNGPC, e a RDC 20/2011 prevê a possibilidade de devolução somente em casos de desvios de qualidade:
Art. 20. É vedada a devolução, por pessoa física, de medicamentos antimicrobianos industrializados ou manipulados para drogarias e farmácias.
§ 1º Excetua-se do disposto no caput deste artigo a devolução por motivos de desvios de qualidade ou de quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo, ou decorrentes de disparidade com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, a qual deverá ser avaliada e documentada pelo farmacêutico.
§ 2º Caso seja verificada a pertinência da devolução, o farmacêutico não poderá reintegrar o medicamento ao estoque comercializável em hipótese alguma, e deverá notificar imediatamente a autoridade sanitária competente, informando os dados de identificação do produto, de forma a permitir as ações sanitárias pertinentes.
Assim, não há como reincorporar o medicamento dispensado e devolvido pelo usuário ao estoque do estabelecimento, pois não existe dispositivo legal que permita essa reincorporação. Ou seja, a impossibilidade da troca de medicamentos controlados e antibióticos decorre de dois fatores: o risco sanitário e o fator legal.
Fonte: Anvisa